ENTENDENDO A DOUTRINA E O CULTO AO SAGRADO CORAÇÃO DE JESUS
Foto: Gaudium Press |
Estando
às portas da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus, é
sempre conveniente nos perguntarmos se realmente compreendemos o que
estamos fazendo quando oramos de modo privado ou comunitário, no dia
dessa Solenidade1,
bem como na primeira sexta-feira de cada mês ou noutro momento em
que a oração tenha como fim este mesmo Coração do Redentor.
Não
nos dedicaremos, nesta postagem, à história do culto ou aos
detalhes litúrgicos, mas ao aspecto doutrinal, que obviamente é
também indispensável para que amemos o que, enfim, conhecemos.
Que
diríamos nós a um protestante que nos perguntasse o que significa
este culto ao Coração de Cristo?
Pois
bem, tomaremos como base a sempre recomendada Catholic
Encyclopedia,
no tópico sobre a “Devoção ao Sagrado Coração”.
Primeiramente
convém afirmarmos categoricamente que a devoção ao Sagrado Coração
de Jesus nada mais é que uma forma especial de devoção ao Senhor
Jesus. São o seu objeto, seus fundamentos e seu ato
próprio que a distinguem.
OBJETO
A
palavra "coração" se identifica imediatamente com o órgão
vital que bate em nosso peito, mas também a aspectos de nossa vida
moral e emocional, com os quais vagamente percebemos alguma íntima
conexão. Por esta razão a palavra "coração", na
linguagem simbólica, designa estas mesmas coisas simbolizadas por
ele. Às vezes ocorre de a palavra passar a designar tão somente as
coisas simbolizadas e já não mais a realidade material. Ex: "alma"
ou "espírito" não nos sugerem normalmente um pensamento
relacionado à respiração; "coração" muitas vezes nos
sugere a ideia de coragem, amor, etc. Assim sendo, isto está mais
para uma metáfora do que para um símbolo, dado que o símbolo é um
sinal real e a metáfora é um sinal verbal.
Em
nosso contexto, o culto é tributado ao Coração de carne, ao passo
em que este simboliza o amor de Jesus, e sua vida emocional e moral.
Direcionado ao Coração material, o culto não para por aí, mas
inclui o amor, que é o seu principal objeto, e que é alcançado
pelo Coração de carne, sinal e símbolo deste amor.
Nesta
devoção, portanto, não se cultua isoladamente o coração físico,
nem tão somente a caridade de Cristo, mas consideram-se os dois
elementos: o elemento sensível, que é o coração de carne, e o
elemento espiritual, que o coração de carne recorda e representa.
Estes dois elementos não devem ser entendidos como dois objetos
distintos, mas como um todo. Dos dois, todavia, sobressai como
essencial o amor de Cristo, que é como a causa e a razão da devoção
de que tratamos. Resumamos dizendo que esta devoção é ao coração
de Cristo, enquanto ele recorda e representa o seu amor, ou ao amor
de Cristo, enquanto recordado e simbolicamente representado por seu
coração de carne.
Sendo
assim, a devoção se baseia sobretudo no simbolismo do coração e,
por isto, não se preocupa tanto com a anatomia. Aliás, deixar o
simbolismo menos evidente, em prol de uma precisão anatômica (ex:
pintá-lo ou esculpi-lo cheio de veias, artérias, átrios,
ventrículos e outros detalhes do órgão humano), seria uma injúria
a esta devoção.
A
ferida no coração (como se retrata nas imagens) é bastante
conveniente e acaba por completar o simbolismo, pois nos recorda e
representa o amor ferido do Senhor (ex: por nossas ingratidões).
Detém-te francês do Coração de Jesus |
O
Coração de Jesus também designa o próprio e inteiro Senhor, todo
amante e amável, sua Pessoa.
Fase
indispensável da devoção ao Coração do Senhor é, também, o
reconhecimento de que este amor é rejeitado, desprezado, ignorado.
Esta realidade é bastante encontrada nas Escrituras e nas
experiências das vidas dos santos (particularmente nas próprias
aparições do Senhor a Santa Margarida Maria, no fim do séc. XVII,
que deram forma a esta devoção).
Este
amor do Senhor manifesta-se nele por inteiro, em suas palavras e
atos, mas três mistérios brilham de forma inigualável quando se
trata de seu amor: a Encarnação, a Paixão e a Eucaristia.
No
Coração de Cristo este amor não é encontrado apenas pelos homens,
mas também por Deus. Todavia, esta devoção dirige-se, sobretudo,
"ao Coração que tanto amou os homens", como dizem as
palavras dirigidas a Santa Margarida Maria.
Por
fim, poder-se-ia perguntar se este amor seria o amor de Jesus homem
ou o amor de Jesus Deus. Ora, o objeto desta devoção é o amor de
nosso Senhor Jesus Cristo, Deus feito homem.
FUNDAMENTOS
– Históricos
Ainda
que se possa dizer que esta devoção foi principalmente propagada
pelo movimento nascido em Paray-le-Monial, cidade francesa, com as
visões e o apostolado de Santa Margarida Maria Alacoque
(22/07/1647~17/10/1690), a devoção não seria menos sólida ou
digna se elas fossem falsas. Ainda que ajudada pelas visões, a
devoção não depende necessariamente delas. A Igreja, aprovando-a,
examinou as duas coisas separadamente.
– Teológicos
O
coração de Jesus, como tudo que pertence à sua Pessoa, é digno de
adoração (culto de latria, que se deve a Deus somente). Não se
considera o coração como isolado ou não conectado à Pessoa de
Jesus. Como já dito, este culto se estende, do coração de carne,
ao amor de Jesus, do qual é símbolo vivo e expressivo. Sendo uma
devoção dirigida à Pessoa de Jesus, ela não precisa de nenhuma
justificativa ou argumentação especial. Jesus, o rosto vivo da
bondade e do amor de Deus, Jesus infinitamente amante e amável, é o
objeto da devoção ao seu Sagrado Coração e, enfim, o objeto mesmo
de toda a religião cristã.
Aparição a Santa Margarida Maria Alacoque século XVII |
– Filosóficos
e Científicos
Para
esta devoção não é preciso dizer que o coração é o "órgão
do amor". Para a devoção basta que o coração seja o símbolo
do amor e que, como base, exista uma conexão entre o coração e as
emoções. O simbolismo do coração é um fato; qualquer pessoa pode
experimentar e afirmar que no coração há uma espécie de eco de
nossos sentimentos. Um estudo fisiológico sobre isso não é,
todavia, necessário.
ATO
PRÓPRIO
Este
ato é exigido pelo próprio objeto da devoção, e seria exatamente
o amor por Jesus. Ele é caracterizado pelo amor recíproco e sua
meta é amar a Jesus que tanto nos amou, retribuir amor com amor.
Dado que o amor de Jesus manifesta-se para a alma devota como um amor
desprezado e ultrajado, o amor expressado na devoção assume
naturalmente um caráter de reparação. Daí a importância dos atos
de desagravo, a Comunhão reparadora e a compaixão por Jesus
padecente. Todavia, nenhum ato especial pode esgotar a devoção ao
Sagrado Coração.
Esta
devoção nos recorda e ensina a obedecer ao sagrado mandamento:
"Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda
a tua alma, de todo o teu espírito e de todas as tuas forças"
(Mc 12,30).
Segundo
o Servo de Deus Pe. João Batista Reus, SJ, "é
sobretudo no Sacrossanto Sacrifício da Missa que nos é dado
retribuir o Amor do Sagrado Coração de Jesus. Eis porque a Santa
Missa em honra do Sagrado Coração é a melhor devoção ao mesmo".
Recomendamos nossa postagem sobre esta devoção na vida do Servo de
Deus2.
Por
fim, recomendamos a leitura da Carta Encíclica Haurietis Aquas,
do Papa Pio XII, que trata exatamente do culto ao Sagrado Coração
de Jesus, e da qual queremos enfatizar a seguinte exortação:
"Desejando ardentemente opor segura barreira às ímpias maquinações dos inimigos de Deus e da Igreja, como também fazer as famílias e as nações voltarem ao amor de Deus e do próximo, não duvidamos em propor a devoção ao Sagrado Coração de Jesus como escola eficacíssima de caridade divina; dessa caridade divina sobre a qual se há de construir o reino de Deus nas almas dos indivíduos, na sociedade doméstica e nas nações, como sabiamente advertiu o nosso mesmo predecessor (Leão XIII), de piedosa memória: 'Da caridade divina recebe o reino de Jesus Cristo a sua força e a sua beleza; o seu fundamento e a sua síntese é amar santa e ordenadamente. Donde necessariamente se segue o cumprir integralmente os próprios deveres, o não violar os direitos alheios, o considerar os bens naturais como inferiores aos sobrenaturais, e o antepor o amor de Deus a todas as coisas'" (Haurietis Aquas, 73).
______________Luís
Augusto - membro da ARS
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1 A
postagem foi originariamente publicada no dia 26 de junho de 2014
(véspera da Solenidade do Sagrado Coração de Jesus), daí porque
adaptamos esta parte do texto para o dia de hoje, final de maio, mês
que antecede a celebração da solenidade.
2 Postaremos, oportunamente, o referido texto.
FONTE: blog Associação Redemptionis Sacramentum – Texto revisto e com grifo e alguns destaques nossos.
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