SANTA GERTRUDES, PRECURSORA DA DEVOÇÃO AO SAGRADO CORAÇÃO
Santa Gertrudes de Helfta, a Grande, Precursora da Devoção ao Sagrado Coração de Jesus |
Santa
Gertrudes[1]
passou
na história da espiritualidade como a santa da Humanidade de Cristo,
já que sua experiência mística e sua doutrina se centram no
Mistério da Encarnação do Filho de Deus: no Verbo Encarnado por
nossa salvação, se manifesta o grande mistério do amor de Deus
para com o homem, sua divina condescendência, sua misericórdia.
Deste núcleo partem todas as atitudes doutrinais, espirituais e
místicas de Santa Gertrudes.
O
fim principal de seus escritos é revelar este infinito mistério de
amor: O Misterium
Pietatis.
Seu
livro, intitulado Legatus
Divinae Pietatis (Mensagem
da Misericórdia Divina[2])
é um mensageiro, um menestrel, um trovador, encarregado de proclamar
em todo mundo e em todos os tempos o mistério do amor pelo qual Deus
chama o ser humano à união consigo em Jesus Cristo.
O
Coração de Cristo é, para Santa Gertrudes, uma das expressões
mais eloquentes e ardentes do Misterium
Pietatis.
As revelações do Coração de Jesus ocupam um lugar central na sua
obra e concentram muitos aspectos de sua doutrina e espiritualidade.
Gertrudes encontra a fonte desta devoção no relato do
traspassamento de Jesus em sua Paixão. Daqui que, se bem que ela não
teve a missão que competia a Santa Margarida Maria Alacoque de
estabelecer o culto litúrgico ao Sagrado Coração, é considerada a
precursora desta devoção.
Seus
escritos sobre o Coração Divino de Jesus, traçados a partir de sua
própria experiência interior, revelam o amor inefável que, desde
toda eternidade, determinou o Verbo de Deus a se unir à humanidade,
e a grandeza e a beleza da alma resgatada pelo Precioso Sangue de
Cristo, chamada a participar de sua própria vida divina. A própria
Gertrudes é o tipo simbólico mais acabado das finezas de Jesus para
com as almas e a profundidade que alcança esta comunhão
sobrenatural.
O
coração, para os medievais, era o centro e o símbolo de todo o
ser, por isso a teologia e a piedade de Gertrudes para com o Coração
de Jesus, se dirige à pessoa inteira do Verbo Encarnado. Sua piedade
não é dolorista1,
senão cheia de serena confiança na vitória de Cristo Ressuscitado,
e na capacidade do homem para responder esse amor e entrar em
comunhão com Ele. Não acentua tanto a dimensão do sofrimento da
paixão, senão antes sua eficácia redentora, nem nela aparece o
aspecto da reparação que caracterizará a devoção ao Sagrado
Coração nos séculos sucessivos, cujo fim especial é a expiação
das ofensas contra a divina Bondade no Sacramento de amor. Gertrudes
acentua antes a dimensão do dom gratuito do amor de Cristo a cada
fiel e à maneira de corresponder a esse amor. O último gesto de
amor de Jesus é ter querido que o golpe da lança abrisse a entrada
de nosso amor para com Ele. A doutrina do suppletio2¸
tão característica de Gertrudes, encontra-se nesta linha de
correspondência à graça.
DIMENSÕES
DO CORAÇÃO DE JESUS
Em
seus escritos, a imagem do Coração de Jesus compreende três
realidades intimamente relacionadas que, – seguindo Hugues Minguet
–, podemos denominar como: o coração humano, o coração
espiritual e o coração simbólico:
– O
coração humano de Jesus: o Sagrado Coração indica em primeiro
lugar, o coração de carne de Jesus que bate no divino peito. Em
Cristo Jesus, seu Coração de Carne está substancialmente unido ao
Verbo de Deus. É ao mesmo tempo o coração de homem e o coração
de Deus. Foi transpassado pela lança na Paixão, mas não é um
coração morto senão vivo, ressuscitado.
– O
coração espiritual: O coração designa sempre a pessoa em sua
integridade (corpo, alma, espírito, razão e liberdade) e em seu
fundamento mais profundo: a capacidade de relação, a abertura ao
amor. Esta noção implica a dimensão afetiva mais vai mais além. O
Coração de Jesus se refere então à Pessoa de Jesus, Deus e homem
verdadeiro. Designa a Cristo inteiro, por uma parte de seu ser,
segundo o procedimento bíblico de metonímia.
O báculo é próprio da abadessa, mas Santa Gertrudes não foi abadessa, e sim Gertrudes de Hackeborn, irmã de Santa Matilde, daí porque existirem fotos da Santa com o báculo |
Indica
também o amor divino de Jesus, do qual seu coração de carne é
símbolo natural. O Coração manifesta a Cristo em sua realidade
mais profunda, no que Ele é em essência: Amor; amor eterno ao seu
Pai enquanto Verbo de Deus e amor infinito para com os homens,
enquanto Verbo feito carne para nos salvar.
Indiretamente,
o Coração se refere a todos os sentimentos da alma de Jesus. É o
órgão principal dos afetos sensíveis de Cristo: seu amor, seu
zelo, sua obediência, seu desejo, sua dor, sua alegria, sua
tristeza; e é também a sede de todas as virtudes do Homem Deus:
mansidão, paciência, temperança, confiança, fortaleza, etc.
Na
Idade Média se considerava o coração como sede da alma, ainda que
não entendido em sentido orgânico ou material. Esta ideia se
reflete em Santa Gertrudes: “Eu
bem sabia, graças a teu ensinamento, que meu coração é a sede de
minha alma”
(L II 15.2[3]).
A
alma, por sua vez, é o princípio dos afetos e da decisão da
liberdade, os quais, portanto, se atribuem ao coração. Diz
Gertrudes se referindo a Cristo: “Quantas
vezes, neste Coração, revelaste-me o íntimo segredo dos teus
desígnios e tuas alegrias”
(L II 23.8).
– O
coração simbólico: o coração de Jesus é o lugar e o símbolo da
união com Deus, da participação na vida divina. Por ele se derrama
e comunica a vida divina que provem do Espírito Santo. Ao contemplar
o Lado transpassado, Gertrudes contempla o próprio amor de Cristo em
sua fonte, o que este comunica: uma vida de amor e um amor que dá a
vida, que faz participar da vida divina. Assim mesmo o Coração de
Cristo concentra, para Gertrudes, todos os mistérios divinos.
O
Coração de Jesus é lugar litúrgico, onde se celebra o verdadeiro
culto de louvor: como único mediador entre Deus e os homens, Cristo
oferece sua humanidade ao Pai, em verdadeiro sacrifício de louvor; e
esse oferecimento supre toda nossa insuficiência e nos capacita com
sua graça para nos unir a seu culto, comunicando-nos sua santidade.
O Coração de Cristo adora, louva, dá graças e glorifica a
Santíssima Trindade; unidas à sua divina melodia, as vozes humanas
se tornam harmoniosas. É por Ele, com Ele e n'Ele, sob a ação do
Espírito, que nós podemos dar culto a Deus Pai.
ANTECEDENTES
PATRÍSTICOS E MEDIEVAIS
Os
Padres da Igreja tinham refletido sobre o relato evangélico do
traspassamento de Jesus, vendo nele a infusão do Espírito, o
nascimento da Igreja e o dom dos sacramentos do batismo e da
eucaristia; mas não haviam interiorizado esta passagem como fonte de
devoção ao amor redentor do Salvador.
Coração de Jesus atravessado pela lança |
Ignorada
nos dez primeiros séculos da Igreja, a devoção ao Coração Divino
de Jesus se insinua em Santo Anselmo (1033-1109), em suas ardentes
meditações sobre a Paixão de Cristo. Mas sobretudo em São
Bernardo que contempla no coração ferido de Cristo, o grande
mistério da Piedade e da misericórdia divina (magnun illud
pietatis sacramentum), sobretudo no sermão 61 sobre o Cântico
dos Cânticos.
Guilherme
de Saint Thierry, Guerrico de Igny, Gilberto de Hoyland e outros
cistercienses contemporâneos ou posteriores a São Bernardo também
intuem no Coração Sagrado, o símbolo do amor misericordioso do
Redentor.
No
século XIII, o próprio Jesus quis revelar a algumas monjas
privilegiadas a devoção que São Bernardo e Santo Anselmo tinham
encontrado, em sua meditação da Paixão. O Senhor mostra a Santa
Lutgarda (1182-1246) a chaga sangrante de seu Lado e une o coração
dela ao Seu; à Venerável Ida (1243-1300), Jesus a faz beber da
fonte de seu peito divino.
Mas
é, sobretudo, no mosteiro de Helfta onde esta devoção encontra seu
desenvolvimento, através das experiências místicas de Santa
Gertrudes (1256-1302) e de Santa Matilde de Hackeborn (1241-1299),
inseparáveis neste ponto, na tradição cristã.
As
Revelações de Jesus a Santa Gertrudes se relacionam a estreita
amizade que a união com o Senhor, e a familiaridade íntima que o
Filho de Deus se dignou ter com ela. Repetidas vezes o Senhor
apresentou a Santa Gertrudes o seu divino Coração, em sinal de
íntima união e comunicação que queria ter com ela; esta união
incluiu a presença interior permanente do Senhor em Gertrudes (L II
3), a revelação de seus íntimos desígnios, a manifestação de
suas carícias amorosas e a comunicação de inefáveis deleites
espirituais. Sua condescendência chegou ao estremo de trocar Seu
Coração com o dela (cfr. L II 23.18). Os doutores franciscanos e
dominicanos aprovaram as revelações de ambas as monjas de Helfta, o
que assegurou sua ortodoxia na história da espiritualidade.
A
devoção ao Coração de Jesus, nascida em ambiente monástico, será
recolhida pelo movimento franciscano nos séculos XIII e XIV:
experimentada por São Francisco no dom dos estigmas, entrevista em
Santo Antônio de Pádua, encontrará seu desenvolvimento em São
Boaventura, e nas místicas de influência franciscana.
São Boaventura e o Sagrado Coração de Jesus (Foto: Salvem a Liturgia) |
A
CONTRIBUIÇÃO PRÓPRIA DE GERTRUDES
A
contribuição fundamental de Santa Gertrudes ao desenvolvimento da
devoção ao Sagrado Coração é sua própria experiência mística
descrita em seus escritos; ela traz imagens específicas e um
conjunto de símbolos através dos quais se traduz sua relação com
o Coração de Cristo, os quais – ainda sem chegar a constituir uma
tipologia sistemática – serão reeditados pelas místicas
posteriores ao largo da história desta devoção, cada uma das quais
a encarnará segundo seu tempo e sua própria cultura.
Por
meio das graças místicas outorgadas a Santa Gertrudes, a devoção
ao Sagrado Coração de Jesus ficou estabelecida em seu fundamento
escriturístico. Em primeiro lugar, encontra sua fonte como dissemos,
no relato do traspassamento de Jesus (Jo. 19, 31-37): Gertrudes
recebe no seu interior os estigmas da Paixão, e seu coração é
transpassado por um raio saído de seu Coração divino.
Por
outro lado, não se trata da veneração das chagas de Cristo morto,
senão das chagas gloriosas de Cristo ressuscitado. O Senhor concedeu
a Santa Gertrudes introduzir sua mão em Seu Coração transpassado e
retirá-la carregada de sete anéis de ouro, como sinal do pacto de
amor que estabelecia com ela, e da garantia das promessas e dons
divinos que lhe fazia (L II 20.9). Esta visão agrega, ao fundamento
escriturístico de Jo 19, 31-37, a da passagem de Jo 20, 24-29, onde
Cristo ressuscitado dá ao apóstolo Tomé uma prova de sua
ressurreição, por meio de um gesto similar.
São João Evangelista encostando a cabeça no peito de Cristo |
Em
outra visão vê o discípulo amado que, recostado sobre o peito do
Senhor na última ceia, tinha bebido com abundância da doçura do
Coração Divino, e que poucas horas depois viu esse mesmo coração
transpassado com a lança. São João faz Gertrudes recostar consigo,
sobre o peito de Jesus, e ela percebe algo da doçura divina das
batidas do Coração Divino. Ao perguntar-lhe por que ele não havia
escrito em seu Evangelho algo sequer da melíflua suavidade dessas
pulsações, este lhe respondeu: “A
eloquência da doçura dessas pulsações se dilatou para os tempos
modernos, para que, ouvindo os homens estas maravilhas, se renove no
mundo envelhecido e tíbio, o amor de Deus.”
(L IV, IV). Esta visão fundamenta a devoção ao Sagrado Coração
na passagem de João 13, 25 e coloca as bases de toda uma
espiritualidade baseada na relação recíproca da alma fiel com o
Coração divino.
Ademais,
Gertrudes relê os textos do Antigo Testamento a partir do Mistério
de Cristo, segundo a exegese espiritual que se praticava na Idade
Média; e, em consequência, aplica ao Coração de Jesus diversas
imagens veterotestamentárias que n'Ele encontram seu cumprimento.
Entre elas, o Coração divino como a Arca da Aliança, a terra
prometida, o Santo dos Santos, o buraco na rocha e a cavidade no muro
onde a pomba faz seu ninho (cf. Ct 2,14).
Por
outra parte, com Santa Gertrudes a devoção ao Sagrado Coração se
mostra como originalmente derivada da Liturgia da Igreja e em
dependência dela: no fundo, Gertrudes tem sempre diante dos olhos a
cena de Cristo, agora glorioso, entronizado com nossa Humanidade na
Santíssima Trindade, à direita do Pai, e intercedendo por nós;
esta realidade, com se sabe, é o fundamento de toda a Liturgia.
Gertrudes foca sua atenção e seu afeto no Amor divino do Redentor,
único Mediador por quem temos acesso ao Pai, e por meio do qual nos
vêm todas as graças; e encontra no Sagrado Coração, a imagem e o
símbolo desse Amor. O tema da Suppletio
é consequência desta concepção litúrgica: o que fazemos aqui na
terra, não tem valor diante de Deus, senão em Cristo, por Ele e
n'Ele, isto é, em união de intercessão com os méritos e orações
de Cristo, união que para Gertrudes se realiza de coração a
Coração. Assim, a devoção ao Sagrado Coração nasce como
desenvolvimento ou prolongação do aspecto cristológico da Liturgia
e fica vivificada pelo espírito da Liturgia.
Finalmente,
suas visões ilustram o conteúdo teológico desta devoção: as
relações do divino Coração no seio da Santíssima Trindade, sua
ação na economia da graça, na Igreja Triunfante, militante e
purgante, assim como a relação recíproca que estabelece com cada
fiel.
Gertrudes
não inova neste campo, mas desenvolve alguns aspectos de uma
tradição que se considera herdeira. Com efeito, os Padres da Igreja
sempre tinham visto no relato da transfixação de Jesus, a fonte
salvífica, o nascimento da Igreja no dom do batismo e da eucaristia,
e a comunicação do Espírito. Mas enquanto João Crisóstomo ou
Agostinho contemplam toda a Igreja e os sacramentos que brotam do
Lado transpassado, Gertrudes, em sua interiorização contemplativa,
se detém mais na própria realidade do Coração ferido, fonte do
amor doado, que se faz sacramento para permanecer conosco. Podemos
dizer que a larga meditação dos Padres sobre o Lado transpassado
encontra seu cumprimento e sua renovação na espiritualidade do
Coração de Jesus que se inaugura a partir dos escritos de Santa
Gertrudes de Helfta.
Uma das diversas aparições de Jesus a Santa Gertrudes |
SÍMBOLOS
E DOUTRINA QUE EMERGE DE SUAS VISÕES
O
Senhor revela os mistérios de seu Coração a Santa Gertrudes
através de diferentes imagens e situações simbólicas de imensa
riqueza, pelos quais exemplifica sua ação sobrenatural nas almas.
Se lhe apresenta como:
– lâmpada
suspensa no meio da alma (L III 25)
– cítara
(L IV 41), lira do Espírito Santo (L IV 48); instrumento em que
sopra o Espírito Santo(L IV 12), órgão da Santíssima Trindade(L
III 49), instrumento de suaves cadências (L V 1)
– turíbulo
de ouro (L IV 26), do que sobem ao Pai tantas colunas de fumaça
quantas são as espécies de homens pelo qual o Senhor padeceu.
– altar
de ouro (L IV 59) que resplandece com raios de fogo, onde se oferecem
os bens, orações e boas obras dos eleitos.
– cálice
(L III 30.2)que o Senhor oferece a Deus Pai; taça de ouro, que Jesus
oferece a sua Mãe Virginal para que beba com regalada doçura(L III
46); copo em que o Senhor dá de beber a alma(L IV 23).
– fonte
dos auxílios da alma, de qual cada qual pode tirar tudo quando
deseje(L III 30.1). Dele brotam rios (L III 53; III 9.4). Do lado
aberto do Cordeiro mana uma fonte ao cálice de propiciação em
favor das almas do purgatório(L IV 17).
– templo
para a alma (Livro III 28.1); casa (L IV 58); lugar de repouso (L III
4; III 30.37; III 53).
– fogo
inextinguível que sai vapor, água e sangue (L III 18.1);; que arde
de amor com tantas chamas quantas pessoas há na Igreja (L IV 25).
– sacrário
cheio de um licor divino de abundante doçura (L II 8.4; IV 58); arca
da divindade (L II 20.9; II 23.8); relicário em que corporalmente
habita toda a plenitude da divindade (L II 7.1); digníssimo arquivo
da Divindade (L III 25).
– tesouro
de infinita riqueza (L III 53; L V 30) em que se encerra todo o bem
(L III 25).
– horto
do Paraíso (L V 30).
– Santo
dos Santos (Livro IV 4.3); buraco no muro (Ct. 2,14) onde a pomba faz
seu ninho (L III 74.3).
As
visões de Santa Gertrudes ilustram a ação do Coração divino na
Igreja Triunfante, militante e purgante, assim como a relação
recíproca que estabelece com cada fiel: Cristo sacia no céu as
almas fiéis com seu coração deífico (L V 3); seu Coração está
aberto de par em par para os que tiveram a caridade consumada (L V
10); Santa Matilde está unida ao Coração deífico enquanto agoniza
e é absorvida por esse Coração na sua morte (L V 4). Gertrudes, ao
expirar, é recebida no Coração divino (L V 1). O Senhor oferece
seu coração no céu, à elevação da hóstia na Igreja (L IV 60);
nele um anjo oferece as tribulações dela, as adversidades e
trabalhos dos eleitos (L IV 60).
O
Coração de Jesus destila inestimável doçura para o pecador
arrependido que deseja se emendar (L IV 58). Inclina-se com ternura
aos que são caluniados sem motivo, porque se assemelham a Ele, que
sempre sofreu calúnias (L IV 58). O coração divino aspira os
louvores com que é exaltado (L IV 48). Nele manam borbotões como
estrelas de maravilhoso esplendor, por causa das virtudes da Mãe de
Deus (L IV 48). O coração de cada santo, segundo a diferença de
suas virtudes, canta continuamente ao Senhor melodiosos louvores (L
IV 50). O divino Coração aspira e aquilata as boas obras que se
executam pela Glória de Deus (L IV 9).
Cristo
oferece todas as mortificações de seu coração ao Pai e às três
vitórias que obteve contra o demônio, para a purificação dos
eleitos (L IV 27). As pulsações perpétuas do Coração de Jesus
operam a salvação dos justos e pecadores (III, 51). O coração
divino recebe os louvores da alma fiel e derrama seus regalados
eflúvios nos santos, nos mortais e nos defuntos (L III 24).
O
amor de sua divina misericórdia força o Senhor a se compadecer
ternamente de seus eleitos em todas as suas adversidades (L IV 23). O
Coração transpassado do Salvador atrai a alma e a purifica (L III
18 2; III 26). Supre nossas fraquezas (L III 41), nossas negligências
e fragilidades e deseja aperfeiçoar nossas boas obras com grande
alegria (L III 25); aceita o oferecimento das dores e enfermidades (L
III, 52). Dá a alma humilde, o orvalho abundante das virtudes e
graças (L III 26); o que a seus próprios olhos se abaixa arrasta
consigo o Coração de Deus (L III 5); a confiança fere amorosamente
o Coração de Deus (L III 7); a alma unida ao Coração divino,
produz copiosos frutos (L III 18.2). Nada pode impedir seu Coração
de fazer o bem a sua escolhida(L III 18.1).
Ao
que deseja oferecer como presente a própria emenda, o Divino coração
lhe dá a luz para isso (L IV 5); do Coração do Senhor sai um
resplendor que, como um farol, aponta o caminho aos que vem a Ele, ao
contrário, os que se guiam por seus próprios meios, se extraviam (L
IV 1). O coração de Gertrudes é uma lâmpada que o Senhor enche
com o azeite de seu divino Coração e o pavio que o faz arder é a
boa intenção (L IV 54). A chave do coração onde o Senhor mora com
agrado é a vontade (IV 23). As tristezas nos colocam mais próximos
do divino Coração (L IV 15). Gertrudes busca os secretos desígnios
e disposições do Coração do Senhor (L III 43). Meditar e
conservar as palavras da Paixão arrasta o amor do divino Coração
(L IV 52). Dirigir o pensamento afetuoso ao Coração de Jesus supre
o que, por fraqueza corporal, não se pode oferecer (L IV 51). Quem
encomenda todas suas coisas à divina bondade, percebe a doçura do
Coração de Jesus (L III 53).
"O coração de Gertrudes é uma lâmpada que o Senhor enche com o azeite de seu divino Coração e o pavio que o faz arder é a boa intenção" (Foto: Gaudium Press) |
O
Espírito Santo mora no divino Coração de Jesus (IV 38) e também
Deus Pai tem um Coração, em que Jesus submerge uma hóstia e a
retira avermelhada, como banhada em sangue. Esta revelação deixa
perplexa e pensativa Gertrudes, “porque
o vermelho simboliza a Paixão e nunca houve nenhum tipo de
sofrimento em Deus Pai”
(L III 17).
Ainda
que vestida de modo concreto e circunstanciado – através da
narração de sua próprias visões – e expressa em uma linguagem
metafórica de grande ressonância evocativa, o ensinamento de Santa
Gertrudes resulta de alta solidez teológica, e explica a ação do
Coração de Cristo na economia da graça e na santificação das
almas, nas suas relações com a Santíssima Trindade e com a Igreja
Triunfante, militante e purgante. Daí porque a tradição cristã
lhe tenha atribuído o justo título de Teóloga
do Sagrado Coração de Jesus.
Em
síntese, a partir da experiência mística de Santa Gertrudes se
inicia, de um modo consistente, a prática da devoção ao Sagrado
Coração de Jesus, estabelecem-se os fundamentos bíblico e
litúrgico de sua espiritualidade, e se desenvolve seu conteúdo
teológico.
___________Ana
Laura Forastieri, OCSO/Monastério de la Madre de Cristo – Hinojo –
Argentina, traduzido por José Eduardo Câmara de Barros Carneiro,
para a Abadia Nossa Senhora Aparecida, das Monjas Cistercienses de
Campo Grande.
NOTAS
(da fonte):
[1]
Bibliografia:
– Hugues
MINGUET, osb, Theologie
spirituelle de Sainte Gertrude:
Le livre II du “Héraut” (III Partie), en Collectanea
Cisterciensia 51 (1989) 317-328;
– Dictionarire
de Spiritualité Ascetique et Mistique, Doctrine et Historie,
Tomo II (1ª Parte), Beauchesne Editeurs, Paris 1948, sub voce: Coeur
(Sacré) cols. 1023-1046;
– Cipriano
Vagaggini, El
sentido Teológico de la Liturgia,
BAC Madrid, 1965; capítulo 22: El
ejemplo de una mística: Santa Gertrudis y la espiritualidad
litúrgica(pp.
696-753), en especial: La
devoción al Sagrado Corazón,
pp. 748 ss.
[2]
N.T.
Mensagem da Misericórdia Divina – Arauto do Divino Amor. Assim se
intitula a versão brasileira do escritos de Santa Gertrudes,
realizada pelo Mosteiro da Santa Cruz de Juiz de Fora, em 2012. Já
está publicado pelas Edições Subiaco, deste Mosteiro, o primeiro
volume, que contém os três primeiros livros de Santa Gertrudes.
Estas estão também editam os Exercícios Espirituais de Santa
Gertrudes.
[3]
“L”
designa: Legatus
Divinae Pietatis.
O número romano indica o livro, e o arábico, o capítulo e o
parágrafo.
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FONTE:
http://www.claustrum.com.br/2016/11/16/santa-gertrudes-precursora-da-devocao-ao-sagrado-coracao/
- Texto revisto por nós, assim como acrescentamos alguns destaques.
2
“A doutrina da suppletio,
tão
característica de Gertrudes, une-se na linha da correspondência de
Deus. A suave bondade do Senhor, inata e essencial à sua natureza,
não porque ama, mas porque é o próprio amor, inclina-se até a
última das criaturas humanas para atrair do mais extremo da sua
excessiva beleza e fazê-la participante de sua majestade e sua
divindade, sem
dúvida para estabelecer com esse exemplo a confiança de toda
pessoa que vive neste mundo. - Ir. Andrea da Santíssima Trindade,
OSB. Mosteiro da Santíssima Trindade, Santa Rosa (RS). cf.
http://refletindo7.blogspot.com/2015/12/santa-gertrudes-de-helfta-e-o-coracao.html
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