«Eis o Coração que tanto amou os homens, que não poupou nada até esgotar-se e consumir-se, para lhes testemunhar seu amor; e por reconhecimento não recebe da maior parte deles senão ingratidões.»(Sagrado Coração de Jesus a Santa Margarida Maria Alacoque)

quinta-feira, 2 de agosto de 2018


HORA SANTA DO MÊS DE AGOSTO
(Por Santo Afonso de Ligório)


Aparição do Sagrado Coração de Jesus a S. Margarida M. Alacoque
(
Lombardia, Bérgamo. 1890-1910)

CORAÇÃO DE JESUS AFLIGIDO POR CAUSA DA INGRATIDÃO DO MUNDO


Um dia S. Francisco de Assis ia chorando e suspirando pelos caminhos e bosques, e parecia inconsolável. Perguntaram-lhe qual era a causa desta profunda aflição, ele respondeu: «Ai! Como quereis que eu não chore, quando vejo que o amor não é amado! Vejo um Deus amar o homem quase até a loucura, e o homem mostrar-se tão ingrato para com Deus! ...» Se esta ingratidão afligiu tanto o coração de S. Francisco, pensemos quanto mais deveria afligir o Coração de Jesus Cristo, no Jardim de Getsêmani. Ele descera do céu para acender na terra o fogo do amor divino, e via que o homem correspondia muito pouco a tantas provas de amor; só isto era bastante para fazê-lo morrer mil vezes de dor. Quando prestamos serviço a algum de nossos semelhantes e este nos paga com ingratidão, temos um sentimento mais insuportável do que todo padecimento corporal. Que dor devia sentir o Coração tão terno e amável de Jesus, vendo que, em retorno de seus benefícios e amor, só receberia de nossa parte ofensas e injúrias, como Davi tinha predito nestes termos: Pagaram-me o bem com o mal, e o amor com o ódio! (Sl 108, 5) Esta profecia cumpriu-se na Paixão de nosso Salvador. Mas ainda hoje não nos parece que ele se queixa de ser como um estrangeiro entre os seus? (Sl 68, 9) porque vê grande numero deles que vivem sem o amar, como se ele não lhes tivesse feito nunca algum bem, como se nada houvesse padecido por seu amor? Porquanto, os animais mesmos, uma vez que lhes fazemos o menor bem, não deixam de nos mostrar seu reconhecimento! Vêm a nós, a seu modo e nos obedecem, e quando nos veem, mostram alegria: e nós, como é que somos tão ingratos para com Jesus Cristo? Dize-me, pode ele fazer mais para merecer nosso amor? Se o Filho de Deus tivesse de salvar da morte seu Pai mesmo, que mais pudera ter feito que abater-se até revestir-se da carne humana e sacrificar sua vida para o resgatar? Digamos mais: se Jesus Cristo tivesse sido puro homem, e não uma Pessoa divina, e tivesse querido, por alguma prova de afeto, obter o amor de Deus, poderia fazer mais do que fez por nós? E se um daqueles que nos servem tivesse dado seu sangue e sua vida por nosso amor, não teria com isto prendido nosso coração? Não nos teria obrigado a consagrar-lhe nosso amor, ao menos por motivo de reconhecimento? Por que então Jesus Cristo, que chegou ao extremo de dar sua vida por nós, não pode chegar ainda a ganhar nosso amor?

Ah! O que tanto afligiu o Coração de nosso Redentor no Jardim das Oliveiras, foi menos a vista de sua Paixão que a ingratidão pela qual os homens haviam de responder a seu amor. Esta ingratidão é que lhe fez suar sangue, reduzindo-o a agonia, e enchendo-o de tristeza tão grande, que só ela bastava para o fazer morrer, como ele declarou: Minha alma está triste até a morte. Esta ingratidão jó o tinha feito chorar no presépio de Belém. Esta ingratidão é que o fez morrer num desamparo supremo e sem consolação alguma, na cruz. Esta ingratidão é que lhe fez desejar que se desse nos últimos tempos um culto especial de reparação e amor ao seu Sagrado Coração: Eis aqui, dizia ele à (Santa) Bem-aventurada Margarida Maria, eis aqui o Coração que tanto amou os homens! ... e da maior parte deles só recebo ingratidões.

Amemos, pois, Nosso Senhor Jesus Cristo! Mas, quais são os meios de fazer nascer e crescer em nós seu amor?

Primeiramente, devemos evitar toda falta grave ou leve; o Senhor disse: Se alguém me tem amor, guardará meus preceitos. (Jo 14, 26)

O primeiro sinal do amor é a intenção em fazer desaparecer tudo o que pode ofender aquele a quem se ama. Como pode dizer que ama a Deus de todo o seu coração aquele que não teme lhe desagradar, ainda que levemente? O céu me livre, dizia Santa Teresa, do menor pecado cometido com reflexão!

Depois, é necessário, para se conseguir amar a Deus de todo o coração, ter grande desejo de o amar. Os pios desejos são azas que nos transportam ao Coração de Jesus.

Enfim, é necessário tomar a resolução de chegar ao perfeito amor de Deus. Muitas almas desejam dar-se a Deus, mas não conseguem, se resolver adotar os meios para isto; também elas não dão um passo para diante. Se queremos amar a Deus, coloquemos mãos à obra: O que podeis fazer, diz o Sábio, fazei-o sem tardar; (Ecl 9, 10) isto é, desapeguemo-nos das criaturas, amemos a Deus sem reserva, e vamos haurir nas fontes do amor, que são a meditação, a comunhão e a oração.

Ah! Como consola o Coração de Jesus, e quão ternamente é amada a alma que se dá a ele sem reserva, não busca em tudo senão lhe agradar, e antes quereria morrer mil vezes que ofendê-lo! Roguemos continuamente ao Coração de Jesus a graça de o amar; peçamos também ao Coração de Maria; esta divina Mãe é a dispensadora de todas as graças; e o que ela dá com melhor vontade, é o dom do amor divino.

PRÁTICA

Pensarei muitas vezes, principalmente durante a Hora Santa, em Jesus Cristo chorando nossas ingratidões; com ele as chorarei, prometendo-lhe para o futuro amor fiel e reconhecido.

AFETOS E SÚPLICAS

Ah! Senhor, chorando então a ingratidão dos homens, choráveis também minha ingratidão e a ruína de minha alma. Amável Redentor meu, vós choráveis à vista do mal que eu fiz a mim mesmo, banindo-vos do meu coração e forçando-vos a me condenar ao inferno, depois de terdes morrido para me salvar. Ah! Deixai-me chorar, a mim que vos fiz a injúria de vos voltar às costas e de me separar de vós; depois de me haverdes dado tantas provas de amor.

Eterno Pai, pelas lágrimas que vosso divino Filho derramou sobre mim, dai-me viva dor de meus pecados. E vós, ó terno e afetuoso Coração de meu Jesus, compadecei-vos de mim: profundamente detesto os desgostos que vos causei, e tomo a resolução de não amar senão a vós.

ORAÇÃO JACULATÓRIA

Ó Coração tão terno de Jesus, oxalá nunca me esqueça de vos.

EXEMPLO

Os padecimentos operam em nós um peso imenso de glória: esta é a razão, porque eles são a sorte das almas mais queridas de Deus. Santa Ludvina nos fornece brilhante exemplo desta verdade. Desde a idade de doze anos, esta admirável donzela se negou a sair de casa vez alguma senão com seus pais e tomou como regra, a que não faltava, evitar toda conversação com moços, receando que o fogo da volúpia, acendendo-se em seu seio, alterasse a brancura de sua veste de inocência. Dotada das mais belas qualidades do corpo, espírito e coração, ela foi, ainda jovem, pedida em matrimônio pelas melhores famílias. Seu pai, apertando-a um dia neste ponto, recebeu a seguinte resposta: «Eu estimo muito minha virgindade para sacrificá-la a um esposo mortal. Ao Rei dos reis é que eu quero ser unida.» A mãe entrou nos desígnios de sua filha e disse a seu marido: «Pois que ela é nossa filha única, demos-lhe ao Deus único.» Animada por estas palavras de sua mãe, Ludvina retornou: «Se quisessem obrigar-me ao matrimonio, eu obteria de Jesus alguma deformidade tão repulsiva, que ninguém havia de me querer.» Logo, com efeito, em consequência de 'uma queda, abriu-se-lhe uma chaga que não houve remédio que curasse. A gangrena instalou-se e a putrefação fez nascer vermes, que lhe devoraram as entranhas em pouco tempo. Cada um de seus membros tinha um tormento particular. Ludvina sofreu este martírio, abandonada de todos, durante 38 anos.

Jesus Cristo foi sua consolação única. Ela dizia com ternura a seu bom anjo: «Ó meu irmão, dizei ao meu Esposo que desfaleço de amor. Oh! Se eu pudesse atrair a mim o meu amado, introduzi-lo-ia no fundo de meu Coração, ou antes eu entraria no seu Coração, e nele me abismaria inteiramente.» Nas suas dores, dia e noite, ela não fazia senão bendizer a vontade de Deus com a paciência de Jó. Um dia, Jesus lhe apareceu, com a cabeça coroada de espinhos, as mãos e pés traspassados, e o Coração aberto. Ele se mostrou também à nossa Santa sob a forma de uma hóstia, no meio da qual se viu um menino crucificado, cujas chagas das mãos, dos pés e do Coração pareciam ensanguentadas, prodígio de que foi testemunha sua família. Muitas vezes, para a consolar, Jesus apertou sua esposa sobre seu divino Coração e lhe deu a beijar suas chagas sagradas. Ela converteu muitos pecadores, falando-lhes das misericórdias do Coração de Jesus. Uma vez, entre outras, um príncipe veio de um país longínquo para a consultar, dizia ele, sobre certos embaraços de consciência. A Santa, percebendo que ele não se animava a tocar no ponto, pôs o dedo sobre as chagas que ele se envergonhava de lhe mostrar, e não omitiu diligência alguma para fazer nascer na sua alma salutar arrependimento. O príncipe, ouvindo-a, derramou lagrimas. «Vós chorais, disse-lhe ela, as menores das ofensas que fizestes a Deus; pecados muito mais graves cometestes e deveis agora chorá-los.» Depois, ela descobriu-lhe seus pecados mais graves, sugeriu-lhe os meios de se livrar deles, e acabou por lhe dizer: «Continuai príncipe a marchar na estrada em que acabais de entrar; confessai-vos com sinceridade, e vive de agora em diante em penitência. Por este meio tornareis propício o Coração do divino Mestre.»

A noite que seguiu à morte de Santa Ludvina, duas santas almas tiveram a mesma visão: o divino Salvador recebendo sua esposa no céu, com as celestes milícias que cantavam sua triunfal entrada, apertou-a com paternal amor sobre seu divino Coração. Assim é que a tristeza se muda em alegria, a dor em glória. Oh! Quanto é doce sofrer amando!, exclamava Santo Afonso. (Vie, par le P. Bruchman.)





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FONTE: livro “O Sagrado Coração de Jesus Segundo Santo Afonso Maria de Ligório ou Meditações Para o Mês do Sagrado Coração, a Hora Santa e a Primeira Sexta-Feira do Mês”, tradução portuguesa da 83ª edição, por D. Joaquim Silvério de Souza, Quinta Edição/1926, Ratisbona Typographia de Frederico Pustet, Impressor da Santa Sé, pp. 249-255 – Texto revisto, atualizado e adaptado para o português do Brasil)

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