NA SEXTA-FEIRA SANTA O CORAÇÃO DE JESUS FOI ABERTO COM UMA LANÇA
O Coração de Jesus aberto pela lança do soldado (Foto: Wikimedia) |
(Após
a morte de Jesus) A multidão voltava arrependida batendo no peito,
mas os príncipes dos sacerdotes continuavam a injuriar
o corpo do Senhor.
Havia
uma lei que dizia: Quando um homem tiver cometido um crime que
deve ser punido com a morte, e for executado por enforcamento numa
árvore, o seu cadáver não poderá ficar ali durante a noite, mas
tu o sepultarás no mesmo dia; pois aquele que é pendurado é um
objeto de maldição divina. Assim, não contaminarás a terra que o
Senhor, teu Deus, te dá por herança (Dt 21, 22-23).
O
Senhor fazendo-se por nós maldição ( GI 3, 13), alcançou
para nós a salvação. Os sacerdotes desejavam cumprir a lei,
sepultando-o naquele mesmo dia, mas também havia outra razão, o dia
seguinte era sábado, dia sagrado (cf. Ex 12, 16).
Os
judeus temeram que os corpos ficassem na cruz durante o sábado,
porque já era a Preparação e esse sábado era particularmente
solene. Rogaram a Pilatos que se lhes quebrassem as pernas e fossem
retirados (Jo 19, 31) .
Sendo
sábado solene, não convinha estragar a festa com uma cena tão
deprimente, corpos pendurados na cruz, contaminando a terra. A
aparente preocupação religiosa era na realidade uma falsidade,
queriam que o povo esquecesse todo o ocorrido e, principal mente,
esquecessem de Jesus. Com os corpos visíveis a todos, muitos
comentários surgiriam. Então pediram para que Pilatos apressasse a
morte deles e que fossem retirados das cruzes. O costume era deixar
os crucificados agonizando na cruz, muitas vezes durante dias, e
depois deixar o corpo para que as aves de rapina se alimentassem.
Quebrando-lhes as pernas, não teriam mais forças para respirar e
morreriam rapidamente.
O
eclipse solar, os tremores e o véu do templo rasgado, não foram
capazes de abrir os olhos dos sacerdotes. Eles não sabiam que o
Senhor já estava morto, e quebrando-lhe as pernas, além da
crueldade, acabariam com tudo.
Tudo
tinha que se cumprir: Não lhe
quebrarás osso algum (Ex
12, 46); não quebrarão nenhum dos
seus ossos (Nm
9, 12); Ele protege cada um de seus
ossos: nem um só deles será quebrado
(SI 33, 21).
Assim se cumpriu a Escritura: nenhum
dos seus ossos será quebrado (Jo
19, 36). Apesar dos inimigos desejarem o contrário.
O
Senhor morreu quando quis, a pesar do esforço dos sacerdotes. Vieram
os soldados e quebraram as pernas do primeiro e do outro, que com ele
foram crucificados. Chegando, porém, a Jesus, como o vissem já
morto, não lhe quebraram as pernas
(Jo 19, 32-33). Naquela mesma hora o
ladrão arrependido foi levado ao Paraíso.
Um
dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança (Jo 19, 34) para ter
certeza que estava morto. De igual modo, os nossos pecados atravessam
o coração de Jesus.
Abrindo-lhe
o lado, feriu seu coração, fonte da vida e da água eterna. A
Igreja canta em seus hinos: doce madeiro, doces cravos que
sustentaram tão preciosa carga.
No
entanto, a lança é chamada de "ferro cruel". Ao abrir o
seu lado, foi aberto a porta do amor, e o Senhor nos quer assim, com
o seu Coração ferido.
Santo
Agostinho comenta que o evangelista não diz feriram seu corpo, mas
abriram indicando que se abria a porta da vida, de onde jorram os
Sacramentos da Igreja, sem os quais não se alcança a vida eterna1.
Eva
tinha nascido do lado do homem velho, Adão. Quando foi aberto seu
lado, Adão dormia; Eva foi chamada mãe dos viventes.
O
novo Adão, Jesus, também dormia, mas o sono da morte; e de seu lado
aberto fez nascer a Igreja viva, mãe dos santos, mãe de todos os
viventes.
Do
lado aberto imediatamente saiu sangue e água (Jo 19, 34),
da qual foi formada e enriquecida sua Igreja. Este mistério é
grande (Ef 5, 32).
Este
é o consolo
dos a batidos, a fortaleza para os que sofrem tentações, o refúgio
dos pecadores. A porta por onde os homens se santificam. É
a porta que Deus mandou Noé fazer na
lateral da arca, para que entrassem todos que haviam de se salvar do
dilúvio (Cf. Gn 6, 16). É
a porta
do templo, chamada Formosa (At
3, 2), refúgio
em que sempre se encontra misericórdia e salvação. Eu
sou a porta. Se alguém entrar por mim será salvo
(Jo 10, 9).
É a porta
cuja chave só os amigos de Deus possuem. É
a porta que desce à adega, onde se
embriagam com o vinho do seu amor. Esta
é a porta do Senhor: só os justos por ela podem passar
(SI 117, 20).
O
nosso coração está todo ele aberto. Não é estreito o lugar que
nele ocupais (2Cor
6, 11-12). Se
São Paulo podia dizer isto, podemos imaginar como é o coração de
Jesus, onde cabe toda humanidade. Para uma casa tão grande, era
necessária uma porta igualmente grande, onde estão escritos os
nomes de todos os homens.
Depois
de ressuscitado, permaneceu com o lado aberto, troféu de sua
vitória. Por isso, quando Tomé colocou os dedos na ferida o
entendimento foi iluminado e acreditou; inflamado de amor, pode
dizer: Meu Senhor e meu Deus
(Jo 20, 28).
Como
atrai suavemente esta ferida! O coração ferido abraça os homens e
os tornam seus amigos. Por isso, o Senhor apareceu aos apóstolos
depois de ressuscitado e mostrou as mãos e o lado aberto. Agora,
além de ferido, o coração está todo aberto.
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1
Cf. Santo Agostinho, Comentário ao Evangelho de São João.
FONTE: in, A Paixão do Senhor, Luis de La Palma, Sexta-Feira Santa – Abriu-lhe o Lado com uma Lança pp. 213-216. O título é nosso.
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